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Revisão da norma de blocos e tijolos cerâmicos traz melhorias ao setor

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ABNT NBR 15270

Revisão da norma de blocos e tijolos cerâmicos traz melhorias ao setor

Com a revisão os ceramistas passam a ter mais opções para oferecer aos construtores, incluindo o bloco estrutural de 9 cm de largura e os tijolos maciços, já adequados à Portaria Inmetro 558 de 2013

Por Carlos Cruz e Manu Souza

Após anos de debates e negociações, o setor finalmente pode comemorar a nova versão da norma ABNT NBR15.270 Componentes cerâmicos – Blocos e Tijolos para alvenaria.

Revisada pelo Comitê Brasileiro de Cerâmica Vermelha (ABNT/CB-179), a norma é dividida em duas partes, que tem como objetivo especificar os requisitos dimensionais, propriedades físicas e mecânicas de blocos e tijolos cerâmicos a serem utilizados em obras de alvenaria com ou sem função estrutural e executadas de forma racionalizada ou não (Parte 1) e os métodos para execução dos ensaios dos blocos e tijolos cerâmicos estruturais e de vedação (Parte 2).

Com a publicação, deixam de valer as normas ABNT NBR 7170, ABNT NBR 6460 e ABNT NBR 8041 de Tijolos cerâmicos e a ABNTNBR15270-3 de Blocos cerâmicos. As novas redações também atualizam os textos da 15.270-1 e 2 de 2005. Esta última revisão proporcionou uma melhor organização no conjunto de textos, reunindo dentro de um único número de norma, proposta em duas partes:

  • ABNT NBR 15270-1: 2017 Componentes cerâmicos – Blocos e tijolos para alvenaria Parte 1: Requisitos;
  • ABNT NBR 15270-2:2017 Componentes cerâmicos – Blocos e tijolos para alvenaria Parte 2: Métodos de ensaios.

Houve grande mudança nos textos normativos uma vez que foram incorporadas as diretrizes de Blocos e Tijolos Cerâmicos, de maneira que estas novas versões foram estruturadas incorporando todos os componentes cerâmicos para alvenaria.
Segundo o diretor da Cerâmica Palma de Ouro, Sandro Silveira, trata-se de uma conquista muito valiosa para todo o setor. Ele ressaltou a importância da adequação dos produtos para fortalecer os fabricantes diante da concorrência.

“A visão que temos que ter como empresários é que a norma não é realizada para a adequação ou redução de custos no processo produtivo das fábricas, e sim para fazer frente a sistemas construtivos concorrentes aos produtos cerâmicos”, afirmou. Silveira, que é superintendente do CB 179, que abriga todas as normas de produtos cerâmicos e participou ativamente das discussões para revisão da 15.270, aposta em ganho no consumo como o melhor benefício que o setor produtivo pode esperar.

Para aumento de produtividade e obtenção de produtos específicos, os ceramistas podem ter que investir em equipamentos de preparação de massa, novas boquilhas, cortadores e sistemas de secagem e queima

Entre as mudanças trazidas pela nova versão da norma, o que ficou mais evidenciado, na opinião do diretor, foi a validação dos blocos de vedação com furos verticais, paredes de 7 mm e septos de 6 mm, para o uso como bloco estrutural para até dois pavimentos (blocos de 9 e 11,5 cm de largura). Para Silveira, a decisão trará maior segurança e menor peso aos produtos. Ainda na linha de blocos de furos verticais para alvenaria estrutural e racionalizada, ele ressaltou a redução dos índices de absorção de água, o que trará, a seu ver, maior segurança para este tipo de aplicação.

“Na conferência de paredes e septos dos blocos de furo horizontal, passa a ser considerada a soma de todas as paredes e não mais as medidas individuais, o que evitará a condenação de peças com pequenos desvios dimensionais ocasionados por alteração ou movimentação das pernas da boquilha. A nova norma também inclui tijolos maciços e perfurados, que não constavam na anterior”, acrescentou.

O consultor técnico da Anicer, Antônio Pimenta,explica que as mudanças eram necessárias e que a revisão mexeu em pontos considerados importantes para todo o setor. Ele também elogiou a possibilidade do desenvolvimento de novos produtos adequados à Norma de Desempenho.

“Foram disponibilizados vários cenários, desde a simples adequação de um produto já existente ao desenvolvimento de novos produtos, algo muito importante perante um mercado recessivo que estamos passando”, declarou. Antônio lembrou que a versão anterior da norma era de 2005 e que, em 12 anos, grandes alterações ocorreram no setor, tornando-se imprescindível a revisão.

O técnico também ressaltou a inclusão das diretrizes para o sistema de Alvenaria Racionalizada. “Foram definidas especificações para os blocos, componentes e procedimentos normalizados, separando os blocos de vedação com furos na horizontal dos blocos de vedação com furos na vertical, agora denominados de blocos para alvenaria de vedação racionalizada”.

O que muda para o ceramista?

Pimenta explica que boa parte da versão de 2005 não mudou e que apenas houve alguns ajustes. Mesmo assim, ele destaca que é importante que o ceramista adquira a nova versão da norma e estude criteriosamente suas especificações, já que o seu cumprimento é obrigatório. Ele lembra ainda que as cerâmicas associadas poderão recorrer aos consultores técnicos da Anicer em caso de dúvidas.

O diretor da Palma de Ouro descartou a necessidade de grandes investimentos por parte dos ceramistas. Para ele, a revisão traz mais fortemente a necessidade de maior controle nos processos produtivos das empresas. E Pimenta complementou: “Para aumento de produtividade e obtenção de produtos específicos, os ceramistas podem ter que investir em equipamentos de preparação de massa, novas boquilhas, cortadores e sistemas de secagem e queima”.

Silveira também destacou que, durante a revisão da norma de projeto, controle e execução de alvenaria estrutural, surgiram algumas importantes melhorias que ainda poderão ser incluídas, como é o caso da Norma de Desempenho. A seu ver, a norma traz muitos requisitos de desempenho que poderão ser incluídos na norma de produtos para garantir algumas características como padrão.

“Penso que sempre haverá o que se evoluir, pois o mercado da construção é dinâmico e se ficarmos parados com certeza estaremos perdendo espaço e mercado”, alertou o diretor. Ele também reclamou da resistência de alguns empresários frente as mudanças.

“Nunca é fácil chegar a um entendimento. Até porque, em um primeiro momento, há a interpretação de que estamos entre adversários, onde os técnicos querem melhorar o produto e os fabricantes querem resolver o problema do processo produtivo. E esses objetivos são muitas vezes antagônicos”. Silveira afirmou ter ficado admirado com a falta da macro visão dos empresários. “Quando você piora ou retira eficiência de um produto, pode prever com certeza que, a médio prazo, perderá mercado para produtos ou sistemas alternativos”, disse.

O diretor também se queixou da pressão sofrida pelos componentes da Comissão para liberar ou suprimir características inerentes ao bom desempenho do produto, o que tornou as negociações ainda mais difíceis. Em seu entendimento, o empresário ou região do país que decidir fazer um produto fora de norma deverá assumir os riscos. “Mas sabemos que o porto seguro para retornar ou recuperar o bom nome no mercado é voltar a cumprir a norma. Agora, quando um setor decide piorar ou retirar características importantes do produto na norma, não importa se uma empresa ou uma região decide fazer produtos melhores que a norma, porque todo o setor ficará prejudicado”, concluiu.

Quando você piora ou retira eficiência de um produto, pode prever com certeza que, a médio prazo, perderá mercado para produtos ou sistemas alternativos

Para Pimenta, uma inclusão importante foi a dos tijolos maciços e perfurados, uma vez que as normas datavam de mais de 30 anos de existência. “Muitos construtores abandonaram projetos com tijolos maciços por causa desta desatualização, cobrada pela Caixa Econômica Federal, que já não aprovava projetos com estes produtos”.

A Anicer e o setor

A Anicer está patrocinando de forma efetiva a revisão de várias normas. Atualmente, seguem em revisão a norma de telhas cerâmicas 15.310 e a 8545, de alvenarias sem função estrutural. A Associação também participou dos trabalhos da antiga 15.812, de projeto, controle e execução de alvenaria estrutural, inicialmente apenas para blocos cerâmicos e depois unificada com blocos de concreto.

Silveira destaca que nos últimos 24 meses o setor passou por um período muito árduo de trabalho, com a intenção de levar segurança e conhecimento dos desempenhos dos produtos cerâmicos para todo o mercado. Para tanto, foram envolvidos, nesse processo, profissionais nacionalmente renomados por suas produções acadêmicas.

“Temos certeza que isso vai se traduzir em mais vendas e em uma maior participação do setor cerâmico no mercado da construção civil. Entendo que toda verba investida pela Anicer, que foi fruto da arrecadação de mensalidades, já que nesses últimos anos não tivemos receitas extras, foi fundamental para a recuperação do setor”, enfatizou.
Em sua opinião, o setor passa por um bom momento técnico, com o envolvimento de vários empresários com visões de curto e longo prazo para o futuro da indústria cerâmica nacional. E frisa que o importante é não perder a oportunidade de fazer um trabalho grandioso e permanente por falta de envolvimento de mais empresários.

“Poderíamos ser muito mais eficientes e conquistar outros resultados de forma muito mais rápida. Hoje, para mim, isso está muito claro. Porém, isso já é uma outra história”, afirmou.

Guilherme Parsekian explica sobre norma de projeto, execução e controle de alvenaria estrutural

Entrevistamos um dos participantes da revisão da Norma, o pesquisador e professor da UFSCar onde atualmente é Coordenador da Pós-Graduação em Estruturas e Construção Civil e do Laboratório de Sistemas Estruturais. Guilherme Parsekian tem mestrado e doutorado pela USP e pós-doutorado pela Universidade de Calgary. Participa ativamente do desenvolvimento de norma de projeto, execução, controle, ensaios e especificação de materiais e elementos em alvenaria. Mesmo a revisão desta norma não estando sob responsabilidade do CB 179, a Anicer apoia a revisão, através da nossa secretaria. Confira a entrevista na íntegra:

Revista da Anicer: Qual a importância dessa última revisão na Norma?

Guilherme Parsekian: Essa revisão é muito especial, pois marca a unificação das normas de Alvenaria Estrutural, independente do tipo de bloco ou tijolo ou material. Assim como no restante do mundo, a normalização brasileira de Alvenaria Estrutural passará a reunir em um único texto especificações para blocos de concreto, blocos cerâmicos, tijolos e outros. Após várias discussões junto a ABNT, foi ainda possível reunir vários aspectos em uma norma única, dividida em partes. O conjunto de textos está muito mais organizado e reunido dento de um único número de norma, proposta em cinco partes:

  • PN 002:123.010-001/1 – Alvenaria Estrutural – Parte 1: Projeto;
  • PN 002:123.010-001/2 – Alvenaria Estrutural – Parte 2: Execução e Controle de Obras;
  • PN 002:123.010-001/3 – Alvenaria Estrutural – Parte 3: Caracterização de Elementos;
  • PN 002:123.010-001/4 – Alvenaria Estrutural – Parte 4: Estrutura em Situação de Incêndio (a ser criado);
  • PN 002:123.010-001/5 – Alvenaria Estrutural – Parte 5: Projeto para Ações Sísmicas (a ser criado).

Existem avanços em vários temas e incorporação de informações relevantes para os projetistas, em especial aqueles que não tem profunda experiência no assunto. Foram incorporados sugestões para as especificações de argamassa, bloco, graute e, principalmente, prisma em função do tipo e da resistência do bloco. Infelizmente é ainda comum projetistas inexperientes realizarem especificações erradas para resistências de prismas, ponto básico da Alvenaria Estrutural. Espera-se que com o anexo incorporado esse tipo de erro não mais aconteça. Foram inseridos tópicos como alvenaria participantes dentro de pórticos de concreto armado ou de aço, onde a alvenaria é estrutural e participa da estabilidade do prédio, calculada e detalhada convenientemente; tópicos para projeto de painéis sujeitos a ações laterais; possibilidade de projeto de paredes de grande altura e elevada esbeltez; melhoria nas especificações para projetos de vigas; esclarecimentos de vários pontos que eram dúvidas do meio técnico como limites de deslocamento lateral do prédio, de efeitos de segunda ordem e vários outros. Também foram totalmente reformuladas as especificações para controle da obra. Existem especificações claras para os lotes e amostras de blocos em obra, possibilidade de reduzir o número de ensaios de prismas e realizar a moldagem em laboratório, dentro de determinadas condições, simplificação no controle de prismas para os casos de empreendimentos com vários edifícios iguais. É possível ainda realizar a moldagem de prismas em laboratório, desde que utilizados os mesmos materiais da obra, sem necessidade de transporte desse delicado corpo de prova. Para tanto, devem ser realizados ensaios de argamassa e graute moldados tanto na obra quanto no laboratório e os resultados devem ser semelhantes. É sugerida a execução de ensaios de prisma oco com 14 dias, acelerando a resposta do controle. Na parte de ensaios, foi formalizada a possibilidade de extração de prismas para verificação da resistência de alvenarias executadas. Devo destacar que todas essas mudanças só foram possíveis devido a participação de vários profissionais e entidades que se dispuseram de seu tempo durante extensivas discussões. Desde 2016 foram dezoito reuniões de norma até chegar na proposta atual. Claro que esses números são variáveis, mas se tomarmos como base reuniões de oito horas e participação de quinze especialistas, em média, são mais de 2.000 horas técnicas até o texto final, o que dá uma ideia do valor agregado ao trabalho realizado. A participação e apoio da Anicer nesse trabalho foi muito relevante.

RA: Quais as principais melhorias e benefícios ela traz aos ceramistas?

GP: Evolui todo o setor da alvenaria estrutural. Talvez os pontos interessantes mais específicos para o subsetor cerâmico sejam a especificação de relações prisma/bloco para blocos de parede maciça que permitem edifícios mais altos, a formalização do cálculo estrutural com tijolos maciços, a especificação de ranhuras internas em vazados de blocos para permitir melhor aderência com o graute. Esse último tópico é muito interessante pois resultados de ensaios recentes mostram que além de melhor aderência, o efeito de desligamento do graute da parede do bloco por conta da retração é muito reduzido nos vazados com ranhuras.

RA: Você considera que algum ponto importante tenha ficado de fora dessa revisão ou chegamos a uma norma ideal?

GP: O texto da norma, fruto de quase dois anos de discussões entre dezenas de profissionais, é atual e contempla boa parte do estado da arte técnica de aplicações em alvenaria estrutural. As partes finalizadas, de 1 a 3, são textos ideais para o momento. Mas a evolução de um texto de norma nunca termina e certamente novos conceitos e especificações serão incorporados no futuro. Ainda deve-se destacar que duas grandes lacunas não foram contempladas e serão tópicos das partes 4 (Estrutura em Situação de Incêndio) e 5 (Projeto para Ações Sísmicas). A intenção é reunir os especialistas e interessados e começar a parte 4 ainda este ano, provavelmente a partir de um Seminário Técnico a ser realizado em meados deste ano na Unicamp, em parceria com Professor Armando Lopes Moreno Junior. Espera-se ter um texto para essa parte em cerca de dois anos. Na sequência, o desafio será o desenvolvimento das especificações para a parte 5.

RA: Quais adaptações serão necessárias nas cerâmicas para o atendimento à norma? Representará grandes investimentos?

GP: As cerâmicas e laboratórios passam por uma fase de adaptação por conta da recente publicação da NBR 15270. A percepção que tenho é que o setor da Alvenaria Estrutural Cerâmica está fortemente engajado em elevar seu padrão de qualidade nos últimos anos, e junto a isso arrojar mais em aplicações estruturais, particularmente em produtos para edifícios de alturas variadas. Infelizmente, havia em algumas partes do Brasil a percepção que o bloco cerâmico estrutural era para pequenas construções, alguns tinham qualidade questionável com grande variabilidade, não apenas dimensional mas também da sua resistência. Essa percepção tem sido alterada, havendo hoje algumas marcas de fabricantes altamente reconhecidas no mercado pela sua qualidade. Observo novas geometrias sendo desenvolvidas, com preocupação de cobrir vários aspectos como boa resistência a compressão com baixo peso do componente, melhor aderência não apenas do graute interno aos vazadas mas também do revestimento externo, melhor desempenho térmico e acústico. Claro que não é possível atender a todos os aspectos ao mesmo tempo, um bloco de maior resistência implica em um componente de maior peso. Porém é possível trabalhar o produto de forma a oferecer uma solução para prédios baixos (de menor peso e resistência moderada), para prédios médios e para prédios altos (de alta resistência, provavelmente mais pesados). Nesse sentido, entendo que o conjunto de normas de Alvenaria Estrutural em revisão apenas organiza as informações, especificações e requisitos para as aplicações estruturais, abrindo possibilidades às cerâmicas. Aquelas fábricas que quiserem explorar essas possibilidades terão sempre que investir. Se o desenvolvimento puder ser feito através da associação de várias fábricas me parece ser possível potencializar resultados.